Pautados
por uma concepção de justiça e democracia, foram muitas as mentes que pensaram
e discutiram caminhos para a educação no Brasil, mas algumas se destacaram pela
riqueza da obra e contribuições às políticas educacionais no País
“A
educação integral não é uma modalidade; é um novo paradigma”. Presente na
literatura e no pensamento acadêmico mundial, o conceito de uma formação
integral – que leva em conta não apenas o componente acadêmico, mas o pleno
desenvolvimento dos educandos – está presente na história contemporânea da
educação brasileira com muita força. Educadores brasileiros foram peças
fundamentais para a construção desse entendimento e foram e ainda são
referência nacional e internacional no debate, demarcando o direito à educação
como estruturante das bases para a conquista de um país justo, solidário e
democrático.
Pautados
por uma concepção de justiça e democracia, foram muitas as mentes que pensaram
e discutiram caminhos para a educação no Brasil, mas algumas se destacaram pela
riqueza da obra e contribuições às políticas educacionais no País. Sem a
pretensão de esgotar o tema, o Centro de Referências em Educação Integral
resgata sete educadores, apresentando – ainda que brevemente – algumas de suas
marcas e posicionamentos para o debate contemporâneo da educação integral.
Confira:
Principal
referência sobre o tema, o educador baiano Anísio Teixeira (1900-1971) é
considerado um dos mais importantes defensores do direito à educação no Brasil.
Para ele, a escola era um espaço de exercício da democracia e principal
instituição republicana, tendo como função a de garantir o pensamento autônomo
e livre dos estudantes a fim de prepará-los para construir a sociedade
desejada.
Autor de
mais de dez livros, Anísio foi o criador da primeira experiência bem sucedida
de educação integral no Brasil, com a criação do Centro Educacional Carneiro
Ribeiro.
Foi também o idealizador das
Escolas Parque, e criador do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais (INEP) e da Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal do Ensino
Superior (Capes) e um dos fundadores da Universidade de Brasília (UNB).
Anísio
esteve ainda entre os 26 autores do Manifesto Pioneiros da Educação Nova,
publicado em 1932 como fruto da discussão do Movimento Escolanovista, que
discutia que a educação deveria garantir a formação ampla dos estudantes e que
todos da sociedade são corresponsáveis pela escola.
Influenciado
pelas ideias do Movimento Escolanovista, e muito próximo de Anísio Teixeira,
Darcy Ribeiro (1922 – 1997), foi um dos principais antropólogos e
pensadores da educação no país. Além de seu envolvimento com a questão
indianista no país, Darcy atuou fortemente pela defesa da escola pública e da
atenção ao desenvolvimento integral dos estudantes.
Foi
Ministro da Educação, e depois Chefe da Casa Civil no governo João Goulart,
deposto pelo golpe civil-militar em 1964. Durante o período ditatorial, teve
seus direitos cassados e foi forçado a se exilar do país, época em que
contribuiu com reformas e discussões educacionais em diferentes países. De
volta ao Brasil, Darcy implementou junto ao Governo Leonel Brizola no estado do
Rio de Janeiro, os Centros Integrados de Ensino Público (CIEPs), uma das principais
políticas de educação integral no país, e que trouxe à tona a necessidade de
integrar as políticas de assistência às ações educacionais.
Autor de
inúmeros livros, e membro da Academia Brasileira de Letras, Darcy também foi o
primeiro reitor da Universidade de
Brasília (UNB), e criador da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF),
que tinha como projeto formações interdisciplinares, em proposta considerada
bastante disruptiva para o cenário do ensino superior no país.
Provavelmente
um dos mais importantes pensadores da história do Brasil, o professor
pernambucano Paulo Freire (1921-1997) defendia transformações radicais para a
educação brasileira. Entre suas inúmeras contribuições, estava a da necessidade
de valorizar o conhecimento popular, integrando-o à pedagogia. Defensor
incansável de um ideário democrático, Freire acreditava que a educação era a
maior das armas contra a opressão, e que a autonomia dos educandos deveria ser
a principal conquista do fazer educativo. Para ele não existe ensino sem
aprendizagem, em uma relação interdependente, de profundo respeito do educador
pelo educando. Leia também: Paulo Freire em seu devido lugar
Entre as
suas várias contribuições à educação, Freire desenvolveu um método de
alfabetização de adultos, baseado no contexto de vida dos educandos, evocando
um princípio muito caro à educação integral – de vínculo e atenção ao território
e às identidades dos sujeitos.
Além de sua vasta obra, Freire
foi secretário municipal de Educação em São Paulo, quando coordenou a
implementação do Estatuto do Magistério, discutiu amplamente o direito dos
profissionais da educação, apoiou amplamente as discussões sobre gestão
democrática e lutou arduamente pelo direito irrestrito à educação pública para
todos. O educador recebeu ainda o título de doutor Honoris Causa por vinte e
sete universidades, e inúmeros prêmios internacionais e nacionais. Em 2012, foi
declarado Patrono da Educação Brasileira.
A pedagoga
Maria Nilde Mascellani (1931 – 1999), educadora em diferentes escolas públicas
do estado de São Paulo, foi uma das idealizadoras das Classes Experimentais,
proposta de educação que visava fortalecer a autonomia dos educandos e seu
envolvimento na gestão escolar. Pouco tempo antes do Golpe civil-militar, a
professora assumiu a coordenação do Serviço de Ensino Vocacional, que tinha
como objetivo disseminar e ampliar a experiência das classes experimentais por
meio dos Ginásios Vocacionais.
Sofrendo
inúmeras pressões da ditadura, Maria Nilde resistiu, insistindo na proposta
libertária de educação e defendeu arduamente os ideais de uma escola pública
autônoma. Foi presa e torturada pelo Departamento de Ordem Política e Social
(DEOPS), indiciada como subversiva, e destituída de suas funções. De volta à
liberdade, Maria Nilde, que publicou inúmeros trabalhos e textos, criou um
centro educacional na Psicologia da PUC-SP, onde foi também foi professora.
Considerado
um dos sociólogos mais influentes no Brasil, Florestan Fernandes (1920-1995),
teceu considerações muito importantes para o debate da educação integral no
país, além de ter sido, como professor, um educador considerado exemplar –
acompanhando, de perto e com atenção irrestrita, todos que foram seus alunos.
Como ideia central em seu pensamento, a educação tem a capacidade de
transformar a sociedade, e a escola seria a instituição prioritária de
fortalecimento do que ele chamava de cultura cívica, a atenção ao interesse
comum, àquilo que é público.
Florestan
defendia que democracia era a liberdade de educar e o direito irrestrito de
estudar, e foi árduo debatedor da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB),
aprovada pouco tempo depois de sua morte e que anuncia o direito à educação
integral. Defensor das ideias do amigo Darcy Ribeiro, o sociólogo pontuava
sempre a importância de se enfrentar as heranças coloniais e escravocratas do
país, com o combate ao racismo e todas as formas de exclusão e opressão e da
construção de um projeto de educação para todos com equidade no país.
Ativo na luta pela escola
pública, foi um dos principais advogados pelo Piso Salarial dos Professores,
pela Eleição de Diretores pela comunidade escolar, incluindo estudantes e
familiares e pelos mecanismos de gestão democrática e participativa nas
instituições educativas.
Cientista
social e pesquisador em educação, o professor da Universidade Federal de Minas
Gerais, Miguel Arroyo, é um dos maiores defensores da educação integral nas
políticas educacionais brasileiras. Entusiasta de uma proposta de educação
popular, Arroyo pesquisa e debate a necessidade de se valorizar a cultura e as
iniciativas dos movimentos populares na construção dos projetos políticos pedagógicos
das escolas.
Defensor
da gestão democrática e da ampla participação dos estudantes e comunidades,
Arroyo critica o modelo enciclopédico do currículo, e discute a importância de
uma pedagogia ligada à vida e aos interesses e necessidades dos alunos. O
professor defende ainda que o papel da escola é o de devolver à pessoa a
humanidade que lhe foi negada; recuperando a dignidade e articulando uma
pluralidade de forças e instituições para garantir a plena integração e
participação social de todas as pessoas.
Além de
seu papel como professor e pesquisador, Arroyo, que é autor de vários livros e
trabalhos, atuou como secretário ajunto de educação em Belo Horizonte (MG), em
projeto pioneiro que alavancou as bases para o programa Escola
Integrada, uma das principais políticas de educação integral no
país.
A
professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e diretora de
Currículos e Educação Integral da Secretaria de Educação Básica no MEC de 2007
a 2013, Jaqueline Moll é uma das principais referências no Brasil sobre a
temática da educação integral. Ávida defensora do direito ao desenvolvimento
integral, e da integração das escolas aos seus territórios, Jaqueline foi
responsável pela criação e implementação do programa Mais Educação.
Para ela,
a escola não pode ser um simulacro da vida real, e, portanto a educação deve
ser pensada na perspectiva do território, ampliando as interações dos
estudantes, e as oportunidades a eles ofertadas. Para tanto, Jaqueline convoca
a perspectiva das Cidades Educadoras, em que equipamentos da saúde, da cultura,
do meio ambiente se integram a fim de fortalecer o desenvolvimento dos sujeitos
em todas suas dimensões e viabilizar a participação de todos em todas as
esferas da sociedade.
Autora de
vários livros e pesquisadora atuante, a professora defende a necessidade de
projetos educativos locais, em que escolas tornam-se coautoras das políticas
educacionais, trazendo o repertório, as características e as necessidades dos
sujeitos e de suas comunidades para o centro do projeto pedagógico.