Para
especialistas, essas informações são mais relevantes para melhorar a educação
do que os rankings.
O Brasil possui um enorme
banco de dados sobre alunos, professores e as escolas da rede pública, mas
essas informações são pouco estudadas e utilizadas na produção de diagnósticos
e na formulação de políticas públicas. Os microdados, como são chamados, são os
resultados dos questionários aplicados em avaliações de larga escala, como o
Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e a Prova Brasil, usada no cálculo do
Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Para especialistas, a
divulgação organizada dessas informações é muito mais relevante para melhorar a
educação no País do que a publicação de um ranking de escolas, como feito pelo
Ministério da Educação (MEC) este ano com o Enem, pois é possível entender, em
detalhes, as razões para um bom e um mau resultado.
Segundo Daniel Cara,
coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a divulgação de
rankings estimula uma competição equivocada entre as escolas, principalmente na
rede privada. Há casos, inclusive, de colégios que selecionam e separam os
melhores alunos para conseguir resultados elevados e transformá-los em
estratégia de marketing.
Rankings não ajudam - O diretor-executivo da Fundação Lemmann, Denis
Mizne, concorda e aponta o ranking como um desserviço ao debate sobre a
qualidade da educação brasileira, embora não seja contra a divulgação do
resultado por escola.
"Não sou contra a
divulgação do resultado por escola, mas ele não colabora com o debate público.
A divulgação de colégios em forma de ranking, pela média, sem levar em
consideração a sua composição, no que ela foi bem e no que ela foi mal, leva a
maus usos dos dados, que são contraproducentes. Para melhorar a educação, o
ranking não adianta nada. A diferença de pontos entre os primeiros colocados é
pequena, mas é uma diferença enorme para os donos dos colégios", questiona
o diretor-executivo da Fundação Lemmann.
Os microdados são capazes
de oferecer um raio-x muito mais claro da qualidade do ensino e do impacto que
diversos fatores (como a composição da escola, o perfil dos professores e o
ambiente escolar) têm no aprendizado. Os questionários aplicados na última
edição da Prova Brasil, em 2011, foram respondidos por cerca de 220 mil
docentes e quatro milhões de estudantes do 5º e do 9º ano do ensino
fundamental, em todo o País, além de mais de 50 mil diretores. A participação é
voluntária.
Os resultados revelam a
condição socioeconômica dos membros da comunidade escolar, se o currículo foi
cumprido, a qualificação dos profissionais, a participação dos pais. Junto com
outros levantamentos feitos pelo Inep, como o Censo Escolar, é possível
descobrir quantas unidades possuem quadra poliesportiva, bibliotecas e salas de
informática. Contudo, estas
informações são disponibilizadas em formatos pouco amigáveis, incompreensíveis
a quem não possui conhecimentos de estatística. Assim, secretarias municipais
que não possuam uma equipe técnica qualificada encontram muitas dificuldades
para extrair conclusões importantes sobre seu desempenho nas avaliações
nacionais e sobre como podem melhorar. Esse serviço, na visão de Daniel Cara,
devia ser disponibilizado pelo próprio Inep.
"O retorno dessas
avaliações, que poderia ser feito de forma pública pelo Inep, é realizado por
meio de empresas que cobram as redes por esses serviços. O Inep poderia ter sua
função muito mais bem aproveitada. Da forma como são divulgados os dados, a
educação tem uma avaliação que segue a lógica do semáforo: a situação está no
vermelho, amarelo ou verde", diz o coordenador da Campanha Nacional pelo
Direito à Educação. "O cruzamento de dados oferece ferramentas boas. Como
o instituto é muito focado no trabalho de produção do Enem, ele acaba não
oferecendo um serviço que revolucionaria o planejamento. Ele poderia formar os
quadros para as secretarias municipais e estaduais de educação e oferecer um
serviço, em regime de colaboração. É preciso também ter um sistema nacional de
avaliação da educação básica sabendo o que pode ser apreendido a partir de cada
prova".
Falta de pesquisadores - Para Ruben Klein, presidente da Associação
Brasileira de Avaliação Educacional (Abave), a cultura das avaliações em larga
escala é recente no Brasil, pois teve início apenas em 1995. Até então, apenas
algumas redes estaduais mantinham experiências isoladas. Por isso, a produção
acadêmica sobre o assunto ainda é insuficiente no País. Ele sugere que as
prefeituras menores procurem parcerias com universidades e centros de pesquisa
para conseguir trabalhar com essas informações. Segundo Klein, as avaliações
mostraram que muitos diagnósticos sobre a situação da educação no Brasil
estavam errados.
"A avaliação começou
para valer em termos nacionais em 1995. Até aí, havia muitos diagnósticos
errados. Falava-se em evasão, mas, na verdade, nosso maior problema era a
repetência. Acreditava-se que a solução era construir escola, quando na
realidade os alunos não estavam aprendendo. O problema é a qualidade da escola.
Essa é uma área recente no Brasil, não tinha ninguém trabalhando com isso. A
partir da década de 1990 é que começaram a surgir alguns grupos", aponta o
presidente da Abave, que tenta estimular o desenvolvimento de trabalhos no
campo.
Cara aponta ainda a falta
de independência do órgão, em comparação com outros institutos da administração
federal, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ligado
ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e o Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), subordinado à Secretaria de Assuntos Estratégicos. A
apresentação das pesquisas realizadas pelos dois é feita pelos próprios
técnicos responsáveis, enquanto no caso do Inep esse papel é assumido pelo ministro
da Educação. Em sua opinião, é fundamental que a equipe do instituto tenha
autonomia para analisar com frieza os números para produzir diagnósticos
consistentes.
Outro lado - Em janeiro deste ano, entre a saída da então presidente Malvina Tuttman
e a chegada do atual, Luiz Cláudio Costa, a Associação dos Servidores do Inep
(Assinep) chegou a publicar uma carta aberta dirigida ao MEC em que lamentavam
as constantes mudanças de comando (foram quatro desde 2009 devido a problemas
na realização do Enem).
Os funcionários alegavam
que "o órgão apresenta fragilidades e ainda não sustenta condições
favoráveis para o pleno desenvolvimento de estudos, pesquisas e avaliações de
acordo com suas finalidades institucionais. Ademais, os salários pouco
atrativos e as carreiras muito longas não representam um estímulo para a
permanência de servidores. A perda de quadros impõe-se como uma difícil
realidade e compõe o rol dos grandes desafios ao cumprimento das finalidades do
órgão".
Procurado pela reportagem,
o Inep informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o tempo entre a
coleta dos microdados da Prova Brasil 2011 e a sua disponibilização na internet
diminuiu em um ano, em comparação com a edição de 2009. O órgão ressaltou que é
preciso um grande esforço operacional para processar as informações.
Está em andamento também
um trabalho para tornar a visualização dos microdados mais dinâmica e amigável
aos usuários, segundo o Inep. O instituto ressaltou que "está se
reestruturando para ampliar cada vez mais o seu papel como uma autarquia que
pensa, reflete e formula estudos e políticas para a educação brasileira. Além
disso, o Inep é hoje uma autarquia capaz de pensar o processo da educação
brasileira, de realizar e aplicar avaliações importantes para o País".
(O Globo)
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segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
Rico banco de dados sobre educação ainda é pouco divulgado e utilizado
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