Diante do mau resultado
brasileiro no Pisa, educadores propõem soluções para melhorar desempenho de
crianças e jovens em ciências
O
Brasil sofre de analfabetismo científico. A avaliação é de educadores
brasileiros que afirmam: nossas crianças não se interessam por ciência e a
razão disso está num ensino fundamental deficiente e desinteressante, com
professores mal preparados e condições inadequadas de infraestrutura. Eles
alertam para o fato de a ciência não fazer parte do cotidiano das pessoas. A
análise foi motivada pelo resultado do Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes (Pisa) 2012, que revelou o mau desempenho dos alunos brasileiros nas
provas de matemática, leitura e ciências. O pior resultado do país foi o 59º
lugar em ciências em um ranking de 65 países.
Pensando
em respostas práticas para melhorar nossa performance, o professor sênior do
Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), Luís Carlos de Menezes,
aposta numa educação mais eficaz não só como preparação para exames. "Isso
não se deve resumir ao ensino das ciências, mas a modificações profundas em
todos os componentes de instrução", enfatiza.
Menezes,
que atua na área de formação de professores, acredita que uma educação melhor
depende de várias transformações que levem, por exemplo, a escola a ser um
espaço de produção cultural, com práticas que envolvam a participação ativa e
propositiva dos estudantes.
De
acordo com o professor da USP, as transformações necessárias não se fazem sem
recursos materiais e humanos e dependem de efetiva vontade política. "A
formação de professores não deve estar restrita a aulas em faculdades, mas a
práticas docentes supervisionadas nas escolas. E a ciência e tecnologia devem
ser tratadas com atualidade e envolvimento criativo, não com ouvir falar de
descobertas dos outros", opina.
Física também é cultura
Para
Nelson Pretto, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal da
Bahia (UFBA) e Secretário Regional da SBPC/BA, também está na política, parte
da solução. "Precisamos de uma política de implantação massiva e universal
de museus, planetários, hackers labs, fab labs, espaços coletivos
associados com a escola, onde a meninada possa criar e claro, tudo isso
fortemente articulado com a cultura, pois como já dizia João Zanetic, professor
de Física da USP, em sua tese de doutorado, "Física também é
cultura", afirma.
Os
hackers labs, a que se refere Pretto, são assim denominados com base na Hackers
Lab – empresa criada na década de 1990, na Coréia do Sul, que passou a
contratar jovens hackers que antes eram investigados por cyber-crimes. Esta
empresa assessorava outras companhias em questões de segurança de rede e com
soluções informatizadas. Já um fab lab (do inglês fabrication
laboratory) é uma espécie de oficina para fabricação de produtos tecnológicos.
Com
esses exemplos Nelson Pretto chama a atenção para a forma como o conhecimento
deve ser transmitido. "A questão fundamental é não achar que a formação
científica seja apenas de forma escolarizada, ou seja, não basta que a
juventude tenha aulas de ciências. Os conteúdos formais são importantes, mas
não são as únicas coisas importantes. Fazer com que os jovens tenham gosto
pelos fenômenos da natureza, pela criação e não apenas pelo consumo de
informação científica", argumenta.
Popularização da ciência
Uma
pesquisa realizada em 2010 pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação
(MCTI) sobre a percepção pública da Ciência e Tecnologia no Brasil mostrou que
a população brasileira não conhece os seus próprios cientistas e muito menos, a
ciência e tecnologia aqui produzidas. A enquete demonstrou também que a maioria
dos entrevistados não frequenta espaços científicos e culturais, como museus,
zoológicos, jardins botânicos e bibliotecas.
Para
Isaac Roitman, professor emérito e coordenador do Núcleo do Futuro (UnB), para
reverter essa vergonhosa posição no PISA é preciso que haja uma inflexão da
divulgação e a popularização da ciência e que o público alvo sejam as crianças,
adolescentes e adultos. "A ciência deve ser matéria diária nos vários veículos
da mídia: jornais, revistas, rádio, televisão, web, etc. Essas matérias devem
abordar desde a história da ciência, as grandes descobertas científicas e
mostrar a aplicação dos resultados das descobertas no cotidiano da vida de cada
um", destaca.
De
acordo com ele, não menos importante é a educação científica que pode ser
perfeitamente iniciada na faixa etária de dois e três anos. Nessa idade as
crianças são curiosas e, portanto ávidas e motivadas para a iniciação
científica. "As nossas crianças não são atraídas para a carreira
científica por várias razões. A primeira é que na maioria dos lares brasileiros
a ciência não faz parte do cotidiano e certamente o analfabetismo científico é
bem maior que o analfabetismo das letras", conclui Roitman.
Para
os educadores, a promoção de feiras de ciências e olimpíadas com a participação
de crianças e jovens também devem ser estimuladas. Na opinião do astrônomo João
Batista Garcia Canalle, coordenador da Olimpíada Brasileira de Astronomia e
Astronáutica (OBA) e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ), para os estudantes terem motivação em aprender é necessária a
experimentação. "Quando o educador provê uma demonstração de maneira
prática, ou seja, uma atividade lúdica que vai além do quadro negro, os jovens
prestam mais atenção. Nosso ensino é puramente livresco. O docente não sabe
passar o conteúdo com ajuda de laboratórios quando os tem. Não sabe improvisar
um experimento ou demonstração", avalia.
Segundo
Canalle, as olimpíadas científicas vêm mostrando aos professores que há muito
de experimental e prático. "E isso tudo pode ser explorado em sala de
aula, desde que se conheça, com certa profundidade, os conteúdos a serem
ensinados. Essas iniciativas tentam levar para os professores conhecimentos,
técnicas de ensino e informações. Torna assim a aprendizagem demonstrativa e
divertida" enfatiza o astrônomo.
(Edna Ferreira / Jornal da Ciência)
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